Irreverência, humor, criatividade, non-sense, ousadia, experimentalismo. Mas tudo pode aparecer aqui. E as coisas sérias também. O futuro dirá se valeu a pena...ou melhor seria ter estado quietinho, preso por uma camisa de forças!
Sexta-feira, 27 de Abril de 2007
Histórias curtas XIX - O tímido (parte III e última)
Haviam decorrido poucos dias desde aquela noite em que o Reinaldo tinha visto gorada mais uma possibilidade de perder a virgindade devido às grandes bebedeiras da Sónia, da Té e dele próprio, quando teve de se deslocar ao ponto de trabalho da colega Anabela Cortês.
Era uma interessante mulher com trinta e cinco anos, uns olhos muito lindos numa cara marota, cabelos castanhos a cobrirem o pescoço, magra e de estatura média. Estava separada do marido e vivia sozinha com a filha Cristina, de oito anos.
Depois de falarem dos assuntos de serviço, a Bela olhou para o jovem de uma forma tão especial que este ficou um pouco perturbado.
- Sabes, Reinaldo? Foi hoje decretado oficialmente o meu divórcio. Sou uma mulher novamente livre – disse ela.
- Parabéns! – acabou por dizer o atrapalhado mancebo.
- E esta noite a minha Tininha vai dormir a casa do pai. Não me apetecia nada ficar sozinha. Não queres passar pelo meu apartamento depois de jantar? – atirou-se descaradamente, a trintona.
- Mas a D. Anabela mora longe e eu não tenho carro – esclareceu o rapaz.
- Eu vou a tua casa buscar-te.
- Pois! Mas não sei se posso...
- Claro que podes! E nem precisas de me dizer onde moras porque eu sei muito bem. Às nove e meia está bem? Se estiveres comprometido, o que eu duvido, desmarcas. Combinado?
O tom imperial da colega não lhe deixava espaço de manobra.
- Combinado! – disse ele, ainda meio atordoado com a surpresa.
- Então, meu lindo, a essa hora esteja pronto porque eu lá estarei para darmos umas voltas e depois irmos comemorar o meu dia da libertação oficial.
- Tudo bem! Terei muito prazer – falou o acanhado moço, um pouco mais descontraído. E agora vou para o meu lugar porque tenho bastante que fazer.
- Vai, lindinho, vai! Mas não te canses muito – disse ela em tom provocador.
O Reinaldo retirou-se e, chegado ao seu lugar, sentou-se na cadeira, recostou-se e começou a pensar:
- Puxa! Nunca pensei ter uma proposta destas. Ela é mesmo ousada. Mas acho que hoje é que vai ser. Nunca pensei ter esta sorte. É uma mulher que me excita imenso.
E continuou, completamente alheio ao que devia fazer:
- De facto, já tinha notado que me deitava uns faróis e me fazia uns sorrisos muito convidativos, mas como é muito mais velha, pensei que fosse a gozar comigo. Afinal parece que tem um fraco por mim. Que sorte!
Quando faltavam poucos minutos para a hora da saída tocou o telefone.
- Reinaldo! Estás muito cansado? – era a voz da Anabela.
- Não, não! De facto até nem trabalhei nada. Não consegui! – confessou ele.
- Escusas de estar nervoso porque eu sei muito bem como lidar com um homem. Toma um beijo e até às nove e meia – despediu-se ela.
- Até logo! – disse ele em voz baixa.
 
Passavam uns dez minutos da hora combinada quando tocou a campaínha do andar dos pais do Reinaldo.
- Até logo papá! Até logo mamã! – e beijou ambos.
- Não venhas tarde! Olha que nós ficamos em cuidado. E amanhã tens de ir trabalhar.
- Está bem, mamã! – e saiu, apressado.
Entrou na viatura, sentou-se ao lado da colega e fechou a porta.
- Então, meu lindo? Queres ir dar uma volta ou vamos já para casa e bebemos uns copos para comemorar? – questionou a Anabela.
Imediatamente o sortudo se lembrou da noite do sábado anterior e respondeu:
- É melhor ir dar uma volta.
- Também acho! Temos muito tempo.
Enquanto conduzia, a sedutora ía falando da sua vida: da felicidade dos primeiros anos do casamento, do nascimento da Cristina, da degradação da ligação conjugal subsequente a um alheamento progressivo por parte do marido em relação a ela, da tomada de conhecimento de que o seu marido tinha uma amante e daquele momento terrível em que ele lhe disse que gostava mais de outra mulher e que queria o divórcio.
O moço foi ouvindo praticamente sem dizer nada e mal notou que, entretanto, ela estacionara num sítio ermo.
- Mas agora chega de falar. Desculpa, mas por vezes preciso de desabafar – rematou ela o longo monólogo.
E sem mais, puxou para si o Reinaldo, procurou a boca dele com a sua e beijou-o sofregamente. O rapaz correspondeu com todo o ardor que tinha. Sentiu que ela apalpava o seu falo que estava a portar-se como era sua obrigação. Correspondeu colocando uma mão no seio da esfomeada fêmea e ouviu-a dizer:
- Aperta-me! Aperta-me muito, meu querido!
E enrolaram-se um no outro o melhor que podiam.
Mas logo de seguida ela falou:
- Vamos para minha casa porque isto aqui não dá jeito nenhum!
E arrancou.
O percurso fez-se quasi em silêncio e só quando estavam perto do apartamento da Anabela esta perguntou:
- Estás admirada com o meu comportamento, não estás?
- Sim! De facto não contava com isto – respondeu ele.
- Nunca tinhas reparado que eu olhava para ti de uma forma especial?
- Sim! Mas pensei que fosse a gozar comigo por eu ser tímido.
- És tímido e tonto! – afirmou a mulher ao mesmo tempo que se ria – Tu és o meu preferido há bastante tempo. És um rapaz bonito e que me provocas ondas de calor.
Mas agora foi ele que ficou ruborizado e acalorado.
Ela continuou:
- Não me atirei mais cedo porque fui esperando por uma reacção tua. Como não reagias planeei atacar agora.
Logo de seguida:
- Pronto! Chegamos! – informou a Bela enquanto metia o carro na garagem.
Subiram no elevador e ela apertou-o contra uma das paredes enquanto o beijava com avidez.
O Reinaldo estava já mais que excitado quando entraram na habitação.
- Senta-te aí enquanto eu abro uma garrafa de champanhe para brindar ao meu 25 de Abril pessoal.
Depois conversaram durante algum tempo ao som de uma bonitas canções.
Ela falava mais, mas ía-lhe fazendo perguntas às quais o moço respondia tratando-a respeitosamente por D. Anabela.
- Olha lá, Reinaldo! É altura de deixares de me tratar por dona e por você. Anabela ou Bela – ordenou a extrovertida divorciada.
- Está bem! Mas na empresa continuo a tratá-la como o fazia antes – refreou o jovem.
- Ok! Ok!
Fez uma pausa e disse:
- Esqueci-me de te dizer para trazeres as tuas coisas, mas não há problema. O que eu quero é que passes a noite toda comigo e amanhã eu levo-te para a firma.
O rapaz teve um tremor:
- A noite toda? – pensou – E os meus pais que estão à minha espera?
Ela pressentiu qualquer coisa e disse:
- Há algum problema?
- Bom! Não! Quero dizer...
- Então diz!
- É que nunca passei uma noite fora e os meus pais podem ficar preocupados – confessou ele.
- Pois é altura de te emancipares e habituá-los a que és um homem. Queres telefonar-lhes? – sugeriu ela.
- Talvez seja melhor, senão eles ficam preocupados e nem dormem. E eu também fico muito mais sossegado.
- Então liga! Eu vou ali ao quarto pôr-me à vontade e já venho.
Quando regressou, vestindo um baby-doll branco e semi-transparente só com um dio dental por baixo, ainda ouviu o fim da conversa.
- Oh mãe! Eu sou um homem e é natural que fique fora uma noite. Estou a avisá-los que hoje não vou mesmo dormir a casa. Está decidido! Até amanhã! Durmam descansados que fico bem.
E desligou.
- Muito bem, meu lindo! Assim é que gosto de ti – disse ela com um sorriso mordaz.
O rapaz estava nervoso e nem reparou na reduzidíssima indumentária da colega.
- Então! Não dizes se gostas de me ver assim?
Ele olhou para ela e disse secamente:
- Gosto! Ficas muito sensual.
- Humm...estás contraído. Vamos para a cama que eu trato de te pôr à vontade.
Pegou-lhe na mão e puxou-o para o quarto.
Mas o Reinaldo estava fixo nas palavras que trocara com os pais ao telefone. Nunca lhes tinha falado assim e sentia-se constrangido.
A Anabela despiu-o completamente enquanto o beijava.
- Agora deita-te debaixo do lençol – comandou, de novo, a trintona.
Ele obedeceu enquanto ela também se punha nua e se enroscava nele, já na cama.
Mas aquela ideia de ter entrado em conflito com os pais, coisa inédita, tornava-se bloqueadora.
- Vá, lá, meu lindinho! Descontrai-te! – dizia ela, depois de tapar o candeeiro com um lenço para tornar o ambiente ainda mais íntimo.
E ia-o acariciando, enchendo de beijos, procurando que o pénis se tornasse em falo mas parecia que a mola estava outra vez desactivada.
Ao fim de bastante tempo e numa demonstração de paciência só possível para alguém que gosta mesmo de outro, falou:
- Tenta dormir! Já é uma da manhã e vai-te fazer bem. Quando acordares estás mais relaxado. E não te importes comigo que eu gosto de ti o suficiente para esperar que estejas calmo, meu lindo.
Só por volta das três da madrugada ele conseguiu adormecer, apesar do calor dos carinhos da Anabela que entretanto caíra nos braços de Morfeu.
Eram cinco e meia, mais coisa menos coisa, quando ele acordou. Sentiu o calor do corpo de mulher junto ao seu e apercebeu-se que estava com o pénis em riste. Agarrou-a como um louco, beijou-a, tocou-lhe o corpo todo, abraçou-a com toda força, penetrou-a e...
Aleluia! Aleluia!
Pareceu-lhe ouvir um coro celestial.
Finalmente conseguira deixar de ser virgem!
Tinha feito amor com uma mulher e não pôde deixar de dizer:
- Como me sinto bem, Anabela! Tu foste espectacular!
- Que bom, meu querido! E sabes que me fizeste vir? Foi uma rapidinha sensacional – comentou ela enquanto o acariciava com ternura.
Dormiram mais um pouco e quando o despertador tocou, ela desligou-o e disse-lhe:
- Que se lixe o trabalho! Depois arranjamos uma desculpa.
E mergulharam novamente nos deliciosos jogos de amor.
 
A partir dessa noite tornaram-se amantes e foram muito felizes durante algum tempo.


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Terça-feira, 24 de Abril de 2007
Histórias curtas XIX - O tímido (parte II)
Poucas semanas depois do fracasso da ida às meninas, o Reinaldo Aguiar recebeu um convite de um jovem colega de trabalho.
- Oh pá! Não queres ir comigo e com duas gajas curtir um bocado a noite de sábado, pá? – disse o Júlio Marques.
O Aguiar não respondeu logo, pelo que o outro continuou:
- É assim, pá! Eu convidei para sair uma boazona porque quero ver se a papo. Mas a fulana só sai se levar uma amiga que até é bem jeitosa. Portanto, não só me fazias o favor de entreter a outra gaja como ainda podes acabar por a comer ou pô-la a fazer-te um bobó ou outra coisa qualquer, pá.
Desta vez o Reinaldo falou:
- Posso responder-te amanhã?
- Podes, pá! Amanhã de manhã, ok pá? Porque se não quiseres aproveitar esta oportunidade tenho de falar a outro tipo. Elas tem ambas vinte e poucos anos como nós, pá. Mas tens de empalear um bocado, senão ela fica junto da minha e estraga-me o programa, pá.
- Está bem! Eu amanhã digo-te se vou ou não – comprometeu-se o rapaz.
Durante o resto do dia e à noite, o Reinaldo foi matutando:
- É uma boa oportunidade. Se der deu, se não der, não deu. Espero que não me saia uma que ponha a placa de fora ou faça coisas que me provoquem novo fracasso. Parece que é nova e jeitosa. Com uns copos eu posso ficar mais desinibido e dizer umas piadas que lhe agradem. E se ela simpatizar comigo, pode ser que se torne mais atiradiça, colabore, e eu desta vez consiga.
Na manhã seguinte, mal encontrou o colega no escritório, disse-lhe:
- Já te posso confirmar, Júlio! Estou disponível para sair contigo e com as moças no sábado à noite.
- Óptimo, pá! A minha parceira chama-se Sónia e a tua é Teresa, mas é conhecida por Té. Não te vais arrepender, tenho quasi a certeza, pá.
- Não te esqueças que eu não tenho carro – lembrou o tímido.
- Não há problema, pá! Eu vou-te buscar e depois vamos a casa da Sónia. Ela tem carro mas vai comigo, pá. A Té parece que não tem mas está em casa da Sónia. Parece que mora perto, pá. Assim vamos os quatro, pá.
 
No sábado seguinte, por volta das dez da noite, o Reinaldo despediu-se dos pais, entrou para o carro do colega e arrancaram para casa da Sónia.
Pouco depois duas jovens, vestidas descontraídamente com jeans, camisa e blusão também de ganga, entraram para o banco traseiro da viatura.
O Júlio, que se apeara para as ir chamar, sentou-se de seguida ao volante e disse:
- Este é o Reinaldo que trabalha lá na minha empresa, pá.
- Olá! – disseram as moças em uníssono.
- Olá! – respondeu o inibido mancebo.
- Eu sou a Sónia! – informou a mais alta e elegante.
- E eu a Té! – apresentou-se a outra, menos elegante mas com uma cara mais bonita.
- Muito prazer! – falou o rapaz, torcendo-se no assento para olhar para ambas.
Eram morenas e de olhos escuros, pelo menos foi o que lhe pareceu.
- Eu proponho irmos beber um copo a um barzinho muito jeitoso e sossegado e depois podemos ir até minha casa, pá. Estaremos à vontade porque os meus velhos foram passar o fim-de-semana fora e levaram a minha irmã. De acordo, pá?
- Por mim estou nessa! – anuiu a Sónia.
- Eu também alinho, pá! – respondeu a outra dando uma risada.
- E tu, Reinaldo? – continuou a Teresa.
- Por mim está fixe!
Pouco depois estavam os quatro sentados numa mesa de um pequeno mas acolhedor bar a falar sobre vários temos.
Depois de café tomado por todos, eles beberam whisky e elas optaram por um licor. Fumaram uns cigarros e, a certa altura, disse o Júlio Marques.
- Vamos agora até minha casa ouvir umas músicas baris que saquei da Net, pá?
- Bora lá, malta! – comandou a Sónia.
E lá seguiram de novo no carro rumo ao apartamento dos pais do condutor.
- Espero que a polícia não me faça soprar no balão, senão estou tramado, pá. É por isso que prefiro estar em casa onde bebo mais à vontade – disse o dono do veículo que conduzia com alguma velocidade mas com segurança, também.
- Não te esqueças que depois tens de nos levar para casa – lembrou a moça mais alta.
- Tudo bem, pá! Eu não abuso. Prometo, pá!
Chegados ao apartamento, sentaram-se todos na sala e a música começou a soar de forma a não incomodar a vizinhança.
- Vocês podem beber à vontade porque não vão conduzir, pá – sugeriu o Júlio.
E os outros não se fizeram rogados: foram bebendo, ora disto ora daquilo...
O anfitrião, atento, disse então para a Sónia:
- Anda ao meu quarto que te quero mostrar uma coisa, pá.
A rapariga, já um pouco tocada e bem disposta, disse logo:
- Vamos lá! E eles não vem?
- Oh Sónia! Eles vem já! Deixa-os curtir um bocado, pá!
- Ok! – concordou a jovem.
- Oh Té! – continuou ela virando-se para a amiga – Vê lá! Não abuses do álcool senão depois ficas mal disposta.
E o parzinho foi para os aposentos do rapaz.
O Reinaldo continuou a beber com a moça. A certa altura, já com uma boa dose de bebidas brancas que o deixaram a falar com a voz entaramelada, de olhos piscos e muito menos tímido, achou que seria a altura de beijar a Teresa. Esta, já estendida sobre o sofá, de olhos fechados, só disse:
- Não me chateies! Quero dormir!
E o Reinaldo pressentiu que ainda não seria daquela que iria perder a virgindade.
Não tardou que também ele estivesse estirado no chão dormindo sossegadamente.
Quando, passados cerca de dez ou quinze minutos, a Sónia saiu do quarto em direcção à casa de banho, nem reparou nos parceiros de noitada. Foi só levantar a tampa da sanita e vomitar com fartura.
O Júlio seguiu-a, observou os dois que dormiam santamente, e desabafou:
- Está tudo bêbedo! Que merda de noite, pá!
Já eram quatro da manhã quando o organizador da farra iniciou a viagem de devolução dos seus convidados aos locais de partida.
A Té ainda vomitou no carro, para cúmulo da irritação do proprietário.
 
Na manhã de segunda-feira, quando se encontraram no trabalho os dois rapazes, disse o Reinaldo:
- A night esteve bem escura, no sábado.
- Não digas nada, pá! Nem um beijo! Começou logo a dizer que estava mal disposta – queixou-se o Júlio.
- Fica para a próxima – falou o pacato moço.
- Para a próxima não as podemos deixar beber tanto, pá. Eu já tinha obrigação de saber que isto podia acontecer, mas como a Sónia se andava a fazer cara, tanto mais que disse que só ía se levasse a outra, pensei que um bocado de álcool ajudasse, pá.
- E ajudava! Mas não foi um bocado; foi um bocadão.
 
E assim o Reinaldo Aguiar viu gorada mais uma oportunidade de se fazer homem.


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Sexta-feira, 20 de Abril de 2007
Histórias curtas XIX - O tímido (parte I)
Reinaldo Aguiar era um tímido.
Mais do que isso, era um tímido quasi patológico.
Com 22 anos e o 12º ano, trabalhava numa empresa em posto de pouca importância, de curta responsabilidade e de baixo salário recebido a troco de um recibo verde.
O emprego foi-lhe arranjado pelo pai.
Filho único, apaparicado, continuava a viver com os progenitores numa casa modesta.
Não tinha carro nem namorada.
Nunca teve coragem para fazer um convite a uma rapariga e, quando eram elas a atiçarem-no, deixava-se ficar indiferente. Não por falta de vontade em corresponder, mas porque alguma força invisível o bloqueava.
Mas agora estava decidido a deixar a vida de eterno solitário e começar a ter relações com mulheres, a todos os níveis. Que diabo! Tinha de vencer a timidez que lhe tornava a vida fastidiosa e muito pouco satisfatória.
E assim resolveu ir às meninas para finalmente perder a virgindade sexual.
Numa noite com o céu estrelado foi até um local que já tinha visitado várias vezes mas sempre sem ter coragem para avançar.
Mas desta vez a determinação era enorme.
Foi caminhando devagar pelo passeio onde as rameiras faziam trottoir ou permaneciam encostadas às paredes das casas lançando olhares e frases de provocação e convite.
- Então filho? Vamos para a cama? – disse-lhe uma delas.
O Reinaldo estacou.
Olhou para ela e viu uma mulher claramente mais velha. Era difícil adivinhar-lhe a idade pois a vida irregular e cheia de complicações fá-las sempre parecer ter mais anos de vida do que aqueles que oficialmente possuem.
- Tem de ser! Vai esta mesmo! – pensou ele, fazendo esforço para vencer a timidez.
E falou:
- E quanto é?
- Quinze euros, fora o quarto – informou a meretriz.
- E quanto é o quarto? – continuou o diálogo, o repentinamente corajoso moço.
- Cinco euros. Mas é bom e limpo.
- Vamos lá! – disse o moço, descarregando algum do nervoso que o tolhia.
- Vamos por aqui, então! – indicou ela, entrando numa porta que estava mesmo ao seu lado.
Ele seguiu-a. Subiram umas escadas de madeira rangendo e ele pode apreciar que ela usava uma saia curtíssima que lhe deixava ver umas calcinhas brancas.
Chegados ao andar superior, a prostituta disse:
- Pagas aqui o quarto – e olhou para um pequeno balcão onde uma mulher já idosa afirmou maquinalmente:
- Cinco euros!
O Reinaldo pegou na carteira, abriu-a, e dela retirou uma nota que entregou à velhota.
- Quarto 7!
- Anda, meu querido! – disse para o jovem.
E a mulher contratada meteu por um corredor estreito parando em frente a uma porta que ela empurrou e logo se abriu. Entrou e o rapaz seguiu-a.
A rameira voltou-se para ele e pediu:
- Primeiro dá-me os quinze euros, filho.
O Reinaldo foi de novo à carteira e entregou-lhe duas notas.
A mulher começou logo a tirar a pouca roupa que tinha e disse:
- Tens camisa?
- Tenho! – respondeu ele.
- Então dá-ma e despe-te.
O Reinaldo entregou-lhe o preservativo, tirou a roupa e ficou nu. Entretanto também a mulher se tinha já despido completamente deixando à vista um corpo com seios descaídos, uma barriga razoavelmente saída e com bastantes estrias, uma boa dose de celulite e algumas varizes bem visíveis nas pernas.
- Deita-te que eu ponho-te isso em pé – ordenou.
O moço esticou-se na cama de barriga para o ar e ela, enquanto lhe pegava no pénis e começava a acariciá-lo disse:
- Tens um belo corpo!
Espremeu a glande para se certificar que o cliente não estava com nenhum esquentamento.
O órgão começou a dar sinais de excitação e ela meteu-o na sua boca para o deixar com a rigidez de um falo competente.
O rapaz permanecia deitado com os olhos fechados.
Pouco depois ela aplicou o condom, deitou-se ao lado dele e disse:
- Já podes meter!
A matrona estava já de pernas abertas e joelhos dobrados e o Reinaldo colocou-se sobre ela na posição do missionário.
Introduziu e começou o movimento de ancas habitual nestas circunstâncias.
A sua cara estava frente à da parceira de ocasião quando esta, gemendo fingidamente, começou a brincar com a placa dentária fazendo-a sair parcialmente da boca e recolhendo-a, várias vezes.
O pobre rapaz, perante tal visão, sentiu que alguma coisa não estaria bem com os seus genitais.
E pouco depois ela comentou.
- Estás sem tesão! Anda cá!
E recomeçou a tentar que o órgão voltasse a entumecer.
Nada!
Passados alguns minutos, a profissional apalpou a base do pénis do coitado e comentou:
- Humm...a molinha está partida. Já não vais conseguir levantar isso. Não vale a pena continuar.
Levantou-se e foi fazer uma rápida higiene, enquanto dizia:
- Podes levantar-te e vestir-te. Agora não vais conseguir. Não gostaste de mim, foi?
O rapaz, frustrado na sua tentativa de perder a virgindade, balbuciou:
- Não! A culpa não foi sua – e começou a vestir-se.
Ainda não estava calçado quando a mulher disse “boa noite” e saiu.
O Reinaldo também se lavou, acabou de se arranjar e, mais acabrunhado do que nunca, abandonou o quarto e o prostíbulo dirigindo-se cabisbaixo para casa dos pais, mas dando uma volta maior que o habitual para tentar limpar a cabeça.
Sem sucesso!
Já na sua cama esperou que o sono chegasse, mas só depois de muito se mexer e remexer é que adormeceu.
Na manhã seguinte, sábado, dormiu até às tantas e acordou bem disposto.
Mas a recordação do fracasso da noite anterior não tardou a deixá-lo de novo em baixo.
- Não posso desistir! Até porque a culpa foi daquela tipa horrorosa – tentava dar-se alento o jovem tímido mas também azarado.


publicado por António às 14:45
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Quarta-feira, 18 de Abril de 2007
Thinking Blogger Award

A Moura ao Luar (http://www.mouraaoluar.blogspot.com) teve a extrema gentileza de nomear este blog como um dos que fazem pensar.

Independente do valor que o Eu sou louco! (II) e o seu antecessor Eu sou louco! (http://eusoulouco.blogspot.com) do Blogger tenham, a escolha honra-me mas também me confere mais responsabilidades.

 

Cabe-me agora nomear cinco, e só cinco, blogs para receber este prémio.

Eis as minhas escolhas, considerando que outros haveria que poderiam merecer a minha opção:

Conversas de xaxa 4 (http://conversasdexaxa4.blogspot.com)

A Papoila (http://a-papoila.blogspot.com)

Bom Dia Isabel (http://bomdiaisabel.blogspot.com)

O mundo da gata preta (http://www.omundodagatapreta.blogspot.com)

Ex Improviso (http://leonoretta.blogspot.com)

***

Nota:

Na barra lateral podem observar o bonito logotipo do

Thinking Blogger Award

***

Aditamento:

Posteriormente, fui também nomeado por

Margusta de Momentos Sentidos (http://margustamar.blogspot.com/)

Lena Maltez de Cabana de Palavras (http://uma_cabana.blogspot.com/)

Maria Goreti Dias de PoesiaMGD (http://poesiamgd.blogspot.com/) e

Isabel Maria de Bom Dia Isabel (http://bomdiaisabel.blogspot.com/)

Para elas o meu mais sincero obrigado.



publicado por António às 16:40
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Sexta-feira, 13 de Abril de 2007
Histórias curtas XVIII - A mulher invisível
Francisco Mesquita era um chefe de família trabalhador e amigo da mulher e dos filhos aos quais procurava não faltar com nada.
Quarentão, de estatura média, trabalhava numa empresa onde ganhava um belo ordenado. Tinha uma barriguita já notoriamente protuberante e um cabelo castanho escuro com poucas cãs mas com umas entradas pronunciadas. Palrador, de verbo fácil e inventivo, era muito teimoso e a opinião dele tinha de prevalecer nem que usasse os argumentos mais estapafúrdios.
A Eva era professora do secundário, baixa e anafada, mas com uma cara ainda bonita.
O Tiago e o Carlos eram os filhos, adolescentes dinâmicos.
Mas o Mesquita, com a sua prosápia, gostava de dizer às mulheres daquelas coisas que elas adoram ouvir. Muitas delas não lhe ligavam nada, mas algumas tomavam-se de amores pelo Chico.
Uma delas era uma funcionária do laboratório, Amélia de seu nome, vinte e poucos aninhos muito bem aplicados num corpo de escultura grega e numa cara de deixar as bocas masculinas em forma de O.
Tanto o parlapatão gabou a sua vivenda à loira rapariga, tanto lhe descreveu os seus interiores, as salas onde se sentava a ouvir musica e a pensar nela, os quartos onde sonhava possuí-la e outros cânticos celestiais, que já levava a moça para uma residencial uma ou duas vezes por semana.
Mas ele insistia em mostrar-lhe a casa. Ela dizia que podia ser perigoso, que era melhor desistir da ideia.
- Não, Melinha! Quero que vejas a casa onde um dia havemos de morar os dois – insistia ele.
E a bacoca da rapariga olhava embevecida para ele.
Até que, um dia, o Mesquita lhe telefonou do seu gabinete e falou assim:
- Minha querida! Vai ser hoje! A velha foi num passeio da escola e os rapazes estão nas aulas.
- Mas de que falas? – perguntou ela.
- Da minha vivenda! É hoje que vamos lá dar uma saltada. Vamos recolher umas amostras de água e depois vou-ta mostrar.
- E tens a certeza de que é seguro?
- Então tu não confias em mim, Melinha? – inquiriu o homem.
- Claro que sim!
- Vou telefonar daqui a pouco à tua chefe e depois saímos no carro da firma que já requisitei.
- Está certo! Fico à espera – anuiu a rapariga.
O trabalho fez com que o Chico se atrasasse mas isso não impediu que, por volta das cinco da tarde e com a maior desfaçatez, ambos entrassem na Vivenda Paraíso.
E o vaidoso Mesquita foi mostrando à loira extasiada as maravilhas de que tantas vezes lhe havia falado.
Mas, de repente, ouviram a porta a abrir-se.
- Esconde-te e não faças barulho! – ordenou ele enquanto a empurrava para dentro do escritório.
Fechou a porta e perguntou:
- Quem está aí?
- Sou eu, Chico! – respondeu a Eva.
- Já? O passeio foi rápido – disse ele sem deixar transparecer qualquer perturbação.
- Foi anulada uma visita e chegamos mais cedo. Como quasi todos os alunos tem telemóvel comunicaram com os pais para os avisar e eu vim logo para casa – explicou a mulher.
- E fizeste muito bem! – mentiu o descarado.
Mas Eva também estranhou a presença do marido em casa e perguntou:
- E tu? Que estás a fazer aqui em casa a esta hora? Sentes-te bem?
- Estou óptimo! Vim aqui procurar uns papéis que me fazem falta lá na empresa.
- Está bem! – rematou a gorducha.
O passarão do Mesquita voltou a entrar no escritório, pegou num dossier e disse para a apavorada Amélia:
- Não tenhas medo! Ela foi para o quarto e vai-se despir. Eu vou lá controlar os movimentos e quando for seguro passo por aqui, abro-te a porta e vens atrás de mim. E tem calma que não vai haver nenhum problema.
Mas eis que a mulher entra no escritório, em trajos menores e vê o homem e a loira.
A primeira reacção foi de tal estupefacção que ficou paralisada, mas não demorou muito a dizer num tom de voz nada amistoso:
- Mas quem é esta mulher?
- Que mulher? – perguntou o mariola.
- Que mulher? Essa loira que está aí ao teu lado! – especificou ela.
- Mas aqui não está ninguém! Que se passa contigo? Estás com alucinações? – negou ele com uma tremenda convicção.
- Tu não me queiras convencer que estou maluca porque estou muito bem da minha cabeça e dos meus olhos – falou a Eva, já aos gritos e com as banhas a saltitar.
- Desculpa, meu amor! Mas de facto não está aqui ninguém. – insistiu o homem na mentira – Só nós os dois.
- Ai não? Então espera aí que já vais ver se está ou não está! – e dirigiu-se para a dispensa tão depressa quanto o pesado rabo manchado por celulite lhe permitia.
- Anda agora, Melinha! É o momento de saíres. Vem atrás de mim.
E levou-a rapidamente até à porta da rua, dizendo:
- Vai de autocarro para a empresa. Depois falamos.
E empurrou a aturdida amante para o pequeno jardim que ficava na frente da habitação, fechou a porta e, quando chegou ao escritório já lá estava a mulher de vassoura em punho.
- Onde está essa galdéria? Vai levar umas mocadas e depois quero que me digas se está ou não está cá alguém.
- Podes ter a certeza que não há cá mais nenhuma mulher além de ti, Eva!
- Ai meu sacana que já a puseste na rua! – discerniu ela.
E, começou a dar umas vassouradas no seu homem, enquanto bradava:
- Não apanha ela, apanhas tu, meu estupor! Toma! Toma!


publicado por António às 14:04
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Domingo, 8 de Abril de 2007
Mens sana in corpore sano
Estando a menos de dois anos de me tornar um sexagenário e tendo deixado de estar dentro do que é chamado o grupo da população activa, por vezes pergunto a mim mesmo o que farei durante o tempo que me resta.
Não sei se é muito nem se é pouco, mas duma coisa tenho a certeza: com vontade e sorte ainda poderei fazer bastante (salvo se for muito em breve para a Quinta das Placas e das Cruzes, facto que espero não se concretize).
E tanto mais quanto mantiver uma mente sã num corpo são (mens sana in corpore sano – usando uma conhecida expressão latina).
Conforme os anos vão avançando, e sobretudo depois do meio século de vida, é natural que a parte física e a parte mental comecem a dar alguns sinais de envelhecimento.
Felizmente, e até agora, não tenho muitas razões para me queixar. Diria mesmo: antes pelo contrário. Sinto-me bem, para além dumas pequenas mazelas que não se me afiguram como relevantes.
Mas devo dizer que também tenho contribuído para isso.
Há vários anos, uns dez ou quinze, tomei consciência que aos quarenta e tal não se pode ter um estilo de vida semelhante ao que se mantinha aos trinta.
A começar no aspecto alimentar. Desde então, comecei progressivamente a alterar hábitos no sentido de evitar o aparecimento de doenças ou características que são habituais na meia-idade: aumento de peso, problemas de tensão arterial, incremento do colesterol, da glicose, da ureia e outros daqueles parâmetros que são controlados por análises ao sangue e urina. E, hoje em dia, como muito menos e mais criteriosamente do que nesses tempos mas, mesmo assim, aumentei um pouco a minha massa corporal.
Comecei a fazer check-up’s anuais para saber como estavam uma série desses valores e que a médica de família (e aqui deixo uma palavra de louvor para o Serviço Nacional de Saúde do qual tanto mal se diz mas que me parece funcionar de forma positiva embora muito longe da perfeição, naturalmente) tem vindo a prescrever de forma crescente ao longo do tempo.
Também fui fumando cada vez menos e agora queimo diariamente uns três ou quatro cigarros.
Constatei (ou foi-me sugerido) que o exercício físico era importante para reduzir a probabilidade de doenças cardíacas e vasculares, manter uma razoável capacidade respiratória e minimizar a flacidez muscular. E eu, que sempre mantivera uma boa aparência física sem praticar qualquer tipo de desporto que para isso contribuísse (salvo no período de férias), comecei há dois anos a caminhar durante meia hora, no mínimo, quasi todos os dias. Mas com uma cadência rápida e não em passo de quem anda a ver as montras. Transpiro tanto quanto posso para assim eliminar as toxinas ou lá o que é. Mais recentemente comecei a fazer alguma musculação e a nadar uns quinze ou vinte minutos três ou quatro vezes por semana. E muito me facilita o facto de viver num condomínio que tem uns aparelhos de força e uma piscina interior aquecida (além de outra exterior). Basta sair do apartamento, descer poucos pisos no elevador...e já estou no ginásio. E como me sinto bem depois desses exercícios (feitos com a moderação que a mim mesmo imponho)!
E dormir? Que bom é, durante a tarde, sentir sono e dizer:
- Vou-me deitar e dormir um bocadinho!
E como durmo como um calhau, ou seja, tenho um sono curto (não mais de cinco ou seis horas diárias) mas recuperador, isso foi um das boas coisas que ganhei ao deixar de trabalhar.
Obviamente que a actividade sexual também foi reduzida de forma natural mas, felizmente, ainda mantenho algum vigor que muito me ajuda a manter a auto-estima.
E posso agora referir que procuro manter a cabeça sempre a funcionar. E um precioso auxiliar para isso é o computador pessoal que me obriga a uma atitude mentalmente muito mais activa do que a leitura, o visionamento de programas televisivos, a audição de música ou mesmo a ida a umas sessões de cinema.
E a escrita? Bendita a hora em que resolvi abrir o blog. Obriga-me a usar a memória, a imaginação e a organizar as ideias de uma forma que resulta muito salutar.
Também uma boa conversa com amigos inteligentes é um bom exercício cerebral.
Finalmente, gostaria de referir que a redução da tensão do dia a dia, o dito stress, é uma outra causa de bem-estar, bem como o ter uma vida afectiva, nos seus múltiplos aspectos, rica e variada.
 
Em suma: possuir uma mente sã num corpo são é a melhor maneira de manter a qualidade de vida, independentemente da idade cronológica.
E se algumas vezes me sinto um pouco velhote, outras sinto-me bem mais novo do que aquilo que está escrito no Bilhete de Identidade.
 
Hoje resolvi falar de mim!
Apeteceu-me!
Soube-me bem!
E vocês?
Ficaram com uma pontinha de inveja.
Ora digam lá se não é verdade!
(os mais velhos, claro!)
Ahh...e juro que não é meu intento ser o morto mais saudável do cemitério!


publicado por António às 23:31
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Segunda-feira, 2 de Abril de 2007
Histórias curtas XVII - A cilada
Gilberto Silveira era um médio empresário com cerca de quarenta anos, tinha um filho que vivia com a ex-mulher, era de estatura e compleição mediana, figura simpática e com um rosto arredondado donde sobressaíam uns olhos grandes e vivos, muito escuros.
Há uns tempos que costuma ir, depois de jantar, até um pequeno bar na zona velha da pequena cidade onde vivia.
Uma noite sentou-se ao balcão, como de costume, e pediu o habitual: um café e um whisky simples.
Pouco depois sentou-se junto dele, com um banco de intervalo, uma mulher vistosa, elegante, de cabelos loiros e pele branca. Aparentava uns trinta anos e aquela cara bonita não era estranha ao Gilberto. Usava óculos escuros, mesmo naquele inverno, que lhe ficavam muito bem.
- Desculpe! Posso sentar-me neste banco? – perguntou ele à desconhecida enquanto se adiantava e ocupava o assento ao lado da jovem mulher.
- Com certeza! – respondeu ela com um sorriso sedutor.
- Não a conheço! Mas a sua cara não me é estranha...
- É natural! Eu vivo aqui e o senhor provavelmente também. Já nos devemos ter cruzado – disse ela.
- Pois! Deve ser isso.
Fez uma pausa e continuou, o Gilberto:
- É a primeira vez que vem a este bar?
- Sim! Começava a estar farta de estar em casa à noite, mesmo com a companhia da TV e da Internet – e deu uma risada discreta.
- Mas que solidão! – exclamou o Silveira, não podendo esconder algum entusiasmo.
Conversaram mais um pouco e, pouco depois, a convite do homem, foram sentar-se numa mesa.
Não tardou muito que Gisela Brito, assim se chamava a mulher, dissesse:
- Tenho de me ir embora! Amanhã entro às oito e meia no emprego.
- Quer que a leve a casa? A noite está feia – ofereceu ele os seus préstimos, solícito.
- Não, muito obrigado! Tenho carro e não bebi álcool – e levantou-se.
- Obrigado pela sua companhia. Gostei muito de conversar consigo – disse o Silveira.
- Eu também!
- Olhe que já está pago! – informou ele.
- Sim? Muitíssimo obrigado. Amanhã venho cá de novo para me pagar outro café – disse a mulher ao mesmo tempo que soltava uma gargalhada cristalina.
E retirou-se.
Na noite seguinte lá se encontraram de novo e assim foi durante mais uns dias até que ela, finalmente, aceitou um convite do homem para darem uma volta.
- Amanhã o meu chefe está fora e dispensou-me durante a manhã – justificou-se a Gisela.
Saíram ao mesmo tempo, como já tinham feito algumas vezes, e ela disse que iria pôr primeiro o carro a casa.
O Silveira anuiu e segui-a até que ela voltou da garagem do prédio que habitava e entrou no automóvel dele, bem encapuçada pois chovia bastante.
Foram até um miradouro que ficava num ponto alto na periferia da urbe e onde costumavam parar alguns carros com casais. Ele estacionou.
Só mais um automóvel lá estava.
- Agora não chove! Vou ver a vista! Gosto muito de olhar lá para baixo, quer de dia quer de noite – e saiu do carro, a jovem.
Ele fez o mesmo.
Aproximou-se da loira, pegou-lhe na mão e beijou-a. Depois abraçou-a e colou a boca à dela.
Eis que lhe prenderam as mãos atrás das costas e lhe colaram um adesivo largo na boca.
Eram dois vultos, com silhueta de homem, que haviam saído do carro que lá estava parado.
Entretanto chegou e parou no local um jeep da GNR e de lá saiu um soldado que se aproximou do grupo sem nada dizer.
A Gisela falou, então:
- Gilberto! Vais pagar caro por teres estragado o casamento da minha irmã, tê-la feito divorciar-se com promessas doiradas e depois despediste-a e abandonaste-a. Levaste-a ao suicídio. Isso não se faz a um Castro. Sim! Porque o meu verdadeiro nome é Susana Castro. Eu vivia noutra cidade mas mudei-me para aqui porque a queria vingar, meu sacana! E chegou o momento!
Um dos homens encostou algodão embebido em éter no nariz do Gilberto que perdeu a consciência.
Desamarram-no e, enquanto dois deles o levavam, um pegando pelos pés outro por baixo dos ombros, pela estrada descendente do miradouro, a Susana ía colocando mais do volátil líquido na vítima e o guarda guiou o carro para uma berma junto de um profundo e abrupto precipício.
Meteram o empresário no veículo e empurraram-no para o abismo.
Impossível escapar com vida!
 
O plano tinha sido urdido pelos três com a maior minúcia. O soldado fora aliciado depois.
A noite chuvosa apagaria algumas marcas que ficassem no chão da zona do miradouro.
Mas havia alguns riscos que era preciso neutralizar:
Alguém poderia ter visto o Silveira e a Susana saírem juntos do bar ou mesmo da casa dela. Mas esse estaria resolvido facilmente pois um dos assassinos era também irmão das mulheres e ao mesmo tempo chefe do posto da GNR. Assim, o José Castro estaria a par de qualquer denúncia e neutralizava-a. Um terceiro elemento era um seu subordinado que, em tempos, tinha feito um roubo de dinheiro no posto e que fora descoberto pelo chefe; mas este ocultou o facto guardando contudo as provas e ficando, deste modo, com o Joaquim nas suas mãos. O Manuel, o quarto elemento, era o antigo marido da mana suicida, a Clara.
Outro risco era estarem mais viaturas no miradouro. Mas, pouco antes do crime, o jeep da GNR tinha passado por lá e dado ordem para se retirar ao condutor da única que estava estacionada com um parzinho.
 
Entretanto, e muito naturalmente, o Gilberto Silveira não voltou a ser visto, o que levou o seu filho e a ex-mulher a deram parte do desaparecimento na GNR.
Mas também o fizeram na Polícia Judiciária de uma cidade próxima já que naquela não existia nenhuma delegação
O José Castro foi encarregue de ajudar a PJ na descoberta da causa do misterioso desaparecimento.
Passam-se várias semanas e nada se descobriu.
A vida da pacata cidade que ainda há poucos anos era uma vila, agitada durante os primeiros tempos após a notícia, voltou à normalidade.
Teria sido cometido o crime perfeito?
 
O inspector Emanuel Vargas da PJ, encarregue do caso, já estava mais preocupado a desvendar outros mistérios quando, numa tarde de primavera, recebeu um telefonema:
- Queria dizer que eu sei quem matou o Gilberto Silveira – falou uma voz de homem.
- Sim? E quem fala?
- Isso não lhe posso dizer. Eu sou uma pessoa conhecida na cidade e não quero que os outros saibam do meu vício de espreitar para dentro dos carros com casais – confessou a nova personagem.
O inspector sorriu, fez um sinal a um agente que estava perto dele e disse:
- Mas pode dizer-me os pormenores?
- Posso, porque eu estava escondido e vi tudo. Sei quem são os quatro assassinos – respondeu o “voyeur”.
- Quatro? Então era importante que passasse por aqui para prestar depoimento. Ou nós vamos falar consigo. Como prefere? – sugeriu o inspector.
- Digo-lhe pelo telefone – respondeu o outro.
- Pode dizer! Mas se não prestar depoimento não podemos incriminar os homicidas – disse o homem da Judiciária.
- E podem dar-me garantias de que o meu vício não será descoberto pela gente da terra?
- Podemos! Basta arranjar um outro pretexto para lá ter estado. Consegue? – inquiriu o policial.
- Claro que não! Caso contrário já teria revelado o segredo há muito tempo.
- Bom! Depois pensamos nisso. Conte-me o que viu, por favor – pediu o Vargas enquanto viu o agente a levantar o polegar em sinal de que tudo estava bem.
E o denunciante contou tudo com muito rigor. Tinha reconhecido a vítima, os dois agentes da autoridade e o ex-marido da suicida. A mulher só descobriu quem era quando ela fez o discurso de despedida para o empresário. Indicou ainda a matrícula dos dois carros e do jeep, que anotara. Enfim! A solução do enigma da morte do Gilberto Silveira estava ali, como que caída do céu.
- Depois temos de inventar uma história para que o seu vício não seja descoberto. Pode contactar comigo amanhã? – disse o satisfeito inspector.
- Sim! Mas porquê?
- Porque não me deu o seu contacto, pois não?
- Nem dou! Está bem! Eu telefono.
- Então até amanhã e obrigado – despediu-se o Emanuel Vargas.
Desligou e perguntou ao colaborador com quem trocara sinais durante o telefonema:
- Segundo percebi localizaste a chamada. Eu fiz a gravação. De qualquer modo mandei-o telefonar amanhã. E é preciso confirmar a veracidade das afirmações, começando por localizar a viatura e o cadáver.
- Sim inspector. Tem aqui o número do telefone utilizado. Até já sabemos onde está. É de uma casa comercial, a Casa Santos.
- O “pestaninha” pensava que era muito esperto – disse sorrindo o inspector.
E continuou:
- Mas se os criminosos confessarem nem precisa de depor. Pode ser que tenha sorte.
E virando-se para outro agente:
- Prepare os seus homens porque vamos imediatamente sair. Eu dou-lhe já mais detalhes. 
Mas só no dia seguinte o carro foi descoberto com o cadáver lá dentro e os criminosos foram presos com grande espanto e alvoroço da populaça.
 
O comerciante Álvaro Santos, homem dos seus cinquenta e tantos anos, muito conhecido na cidade, solteirão, viu entrar um homem pelo seu estabelecimento.
- Senhor Santos! Podíamos falar um bocadinho? – pediu baixinho o Vargas.
- Sim! Venha ao meu escritório. – respondeu o mirone – É o senhor inspector, não é?
O outro fez um sinal afirmativo com a cabeça.
Entraram, fecharam a porta e disse o homem da PJ:
- Quero agradecer toda a sua colaboração. Já temos algumas confissões mas contamos obter mais. Se assim for, o senhor não precisará de depor. Mais uma vez muito obrigado.
- Eu é que agradeço, senhor inspector.
E o homem da Polícia Judiciária abandonou a Casa Santos.


publicado por António às 22:37
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